Os Anos 60
Os anos 60, acima de tudo, foram um período de explosão de juventude em todos os aspectos. Era a vez dos jovens, que influenciados pelas idéias de liberdade - "On the Road" – (título do livro de Jack Keurouac, de 1957) começavam a se opor à sociedade de consumo vigente. O movimento, que nos 50 vivia recluso nos EUA, passou a caminhar pelas ruas nos anos 60 e influenciaria novas mudanças de comportamento, como a contracultura e o pacifismo do final da década.
Nesse contexto, nenhum movimento artístico causou maior impacto do que a Arte Pop. Artistas como Andy Warhol, Roy Lichetenstein e Robert Indiana usaram irreverência e ironia em seus trabalhos. Warhol usava imagens repetidas de símbolos populares da cultura norte-americana em seus quadros, como as latas de sopa Campbell, Elvis Presley e Marilyn Monroe. A Op Art (abreviatura de optical art, corrente de arte abstrata que explora fenômenos ópticos) também fez parte dessa época e estava presente em estampas de tecidos.No ritmo de todas as mudanças dos anos 60, o cinema europeu ganhava força com a nouvelle vague do cinema francês ("Acossado", de Jean-Luc Godard, se tornaria um clássico do movimento), ao lado do neo-realismo do cinema italiano, que influenciaram o surgimento, no início da década, do cinema novo (que teve Glauber Rocha como um dos seus iniciadores) no Brasil, ao contestar as caras produções da época e destacar a importância do autor, ao contrário dos estúdios de Hollywood.
Durante essa década, o reduto jovem mundial se transferiu para São Francisco (EUA), região portuária que recebia pessoas de todas as partes do mundo e também por isso, berço do movimento hippie, que pregava a paz e o amor, através do poder da flor (flower power), do negro (black power), do gay (gay power) e da liberação da mulher (women's lib). Manifestações e palavras de ordem mobilizaram jovens em diversas partes do mundo.
Mas, paralelamente, um problema iria assumir proporções internacionais também a partir dos anos 65-66. A cada dia, em vários países - do Brasil ao Japão, dos Estados Unidos à Tchecoslováquia - os estudantes substituíam a rotina das aulas pela rotina das greves, das manifestações, dos protestos e das ocupações de faculdades. Suas organizações políticas multiplicavam-se e os choques com a polícia tornavam-se freqüentes. Protestos comuns iam dando um mesmo sentido às manifestações em várias partes do mundo: as demonstrações eram contra a guerra do Vietnã, contra o racismo, pela paz, pelos subdesenvolvidos.
A esse conjunto de manifestações, que surgiram em diversos países, deu-se o nome de contracultura. Uma busca por um outro tipo de vida, underground, à margem do sistema oficial. Faziam parte desse novo comportamento, cabelos longos, roupas coloridas, misticismo oriental, música e drogas.
A rebeldia dos anos 60 culminou em 1968. O movimento estudantil explodiu e tomou conta das ruas em diversas partes do mundo e contestava a sociedade, seus sistemas de ensino e a cultura em diversos aspectos, como a sexualidade, os costumes, a moral e a estética.
Nesse sentido, para as mulheres, o surgimento da pílula anticoncepcional, no início da década, foi responsável por um comportamento sexual feminino mais liberal. Porém, elas também queriam igualdade de direitos, de salários, de decisão.
Os 60 chegaram ao fim, coroados com a chegada do homem à Lua, em julho de 1969, e com um grande show de rock, o "Woodstock Music & Art Fair", em agosto do mesmo ano, que reuniu cerca de 500 mil pessoas em três dias de amor, música, sexo e drogas.
Mais do que os jovens, o mundo havia mudado. A sociedade industrial avançava rompendo princípios, modificando as relações e as condições de vida. Os meios de comunicação quebravam os valores regionais e introduziam uma cultura uniforme sem fronteiras. Em face de valores como o amor, a liberdade, a justiça e a fraternidade, surgia uma nova realidade - o consumo - estabelecendo seus próprios valores: a eficácia, o sucesso, a competição. Mais eficazmente do que a sociologia na sua busca de configurar a juventude, as grandes organizações comerciais descobriram nos jovens todo o potencial do consumidor: em apenas quarenta anos, o número dos jovens até 24 anos duplicaria. Toda uma linha de produção - discos, roupas, espetáculos - foi concebida a partir deles para eles. Os personagens que os jovens transformaram em ídolos (dos Beatles a Che Guevara), justamente porque tinham contestado o sistema, lhes foram devolvidos, comercializados: moda Mao, camisas com o rosto de Che, posters dos Beatles. O consumo transformava a contestação a ele, num rendoso produto de consumo.
Uma dinâmica nova surgia. Os jovens contestavam a sociedade e essa consumia a contestação. Uma busca desesperada de afirmação para fazer valer a sua negação passava a ser realizada em todos os campos - na moda, na pintura, no cinema e, sobretudo, na música. As suas cores gritavam tanto quanto o seu som, agressivo e agônico. As boates românticas cederam lugar às discotecas onde tudo ganhava dinamismo, desde as luzes aos corpos.
As grandes concentrações, como a de Woodstock, demonstraram o sentido profundo da comunidade que estava se formando entre os jovens daquela década e a compreensão mística de si mesmos como um grupo à parte: um "nós" em franca oposição a "eles".
"Eles" representava o mundo adulto dos pais e sua impotência em viver os valores que pregam. "Eles" eram, também, os sistemas sociais incapazes de preencher o vazio entre ideal e realidade. A constatação do fracasso da civilização criada pelas gerações anteriores - de guerras, injustiças sociais, violência e repressão.
Em 1969 podia-se perguntar o que mais havia ficado da contestação mais radical que os estudantes fizeram de uma sociedade. De sua revolta ("a sociedade é uma flor carnívora"), do seu lirismo ("o tédio está chorando"), de sua poesia ("eu me liberto nas pedras da rua"), de sua afirmação ("as liberdades não se exigem; são tomadas"), de suas ambições ("a imaginação no poder"), de sua liberdade ("é proibido proibir", "sim ao não"). Mao, Marx, Che, Trotski, Ho Chi Minh, Lênin, Rosa Luxemburgo conviveram em citações ao lado de Rimbaud ("é preciso mudar a vida") e Antonin Artaud ("nunca estudei, mas tudo vivi e isso me ensinou alguma coisa").
Formas obsoletas de luta eram desenterradas (a pedra, a barricada, o pau), templos do saber como a Sorbonne eram invadidos. Ídolos de outras gerações, como Sartre e o comunista histórico Aragon, eram vaiados, carros incendiados, teatros tomados. A imaginação havia tomado o poder. Todos os valores oficiais e tradicionais eram escritos entre aspas e provocavam risos. As ruas eram rebatizadas por centenas de jovens eufóricos que escolhiam os novos nomes entre aplausos: Rua do Oriente Vermelho, do Vietnam Heróico, Rua Guevara. Bandeiras vermelhas e pretas flutuavam em monumentos austeros e cobriam relíquias históricas. O amor e a política passaram a ser feitos nas ruas.
Evadir-se ou participar da destruição da sociedade, eis a opção a que jovens se colocavam. Evadir-se foi a resposta hippie. Mais de 400.000 jovens, só nos EUA, deram as costas à sociedade e saíram à procura de outras verdades. Os hippies marginalizaram-se e tentaram uma revolução da moral e dos costumes. Os jovens dos países socialistas reivindicavam liberdade política, enquanto os dos países industrializados do Ocidente contestavam a civilização de consumo que aliena o homem. No terceiro mundo, a luta era pela liberdade econômica.
Psicodelismo
O psicodelismo foi um caminho que grande parte da juventude estava escolhendo ou iria escolher nos anos 60, dentro do contexto da contracultura. Teve vida curta, mas foi de grande influência e incandescência.
Os designers psicodélicos da época rejeitavam o modernismo como algo fora de moda. Enquanto os modernistas olhavam apenas para o futuro em busca de inspiração, o psicodelismo olhava para todos os lugares, muitas vezes através das alucinações provocadas por drogas alucinógenas. Seus artistas buscavam inspiração no início do século, incorporando aspectos do Art Nouveau e da secessão de Viena em seus trabalhos; olhavam para o Oriente e regrediam até o Egito antigo em busca de referências; olhavam também para o seu próprio mundo, criando uma linguagem visual inspirada na droga (LSD) que visava a um público seletivo.
As drogas eram legais na Califórnia até 1966, e sua influência na percepção, imitada nos concertos através das luzes estroboscópicas e de dissonantes acordes de guitarra, era simulada nas peças gráficas por meio de uma deslumbrante repetição de contrastes cromáticos, seja em preto e branco, seja entre cores complementares. Muitos designers afirmavam escolher sua palheta de cores a partir de suas experiências visuais com o LSD.
O LSD, também conhecido como “ácido”, é uma substância sintética que causa alucinações, em sua maioria, na área visual ou auditiva. Os primeiros efeitos são físicos e começam cerca de uma hora após a ingestão da droga. Os efeitos variam de uma vaga sensação de ansiedade à náusea, sendo acompanhados por aceleração da pulsação, pupilas dilatadas, dentre outros. Em seguida, o usuário entra num estado de grande sugestionabilidade: sua capacidade de receber e analisar de forma estrutural as informações do ambiente fica distorcida. A experiência pode induzir a um estado de cruzamento dos sentidos, no qual o usuário “vê a música e ouve cores”. A percepção espacial também é alterada e as cores têm suas intensidades realçadas; imagens caleidoscópicas e tridimensionais flutuam no vazio.
Com isso, os designers desejavam obter esses efeitos de vibração óptica através das cores e das formas das letras, que tornavam quase ilegíveis através de uma total equivalência entre elementos positivos e negativos: o espaço existente entre as letras e dentro delas era contrabalançado pelas próprias letras, da mesma maneira que as cores contrastavam entre si com igual intensidade. Há quem diga que o objetivo dessa “falta de clareza” nas letras era “garantir que ninguém acima de trinta” as lessem.
Essa superposição de imagens e textos altamente coloridos e contrastantes era relativamente simples de ser produzida. Muitas vezes era utilizada a tecnologia do “faça você mesmo”. Em todo o mundo, as peças gráficas psicodélicas eram bem aceitas, ainda que utilizassem uma má qualidade de impressão off-set em papel barato, como o caso de algumas revistas underground.
Um dos designers mais famosos desse período foi Wes Wilson, destacando-se na produção de peças gráficas para shows de rock. Victor Moscoso também realizou trabalhos notáveis, e era o único com formação
Capas de disco
The Beatles - Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band (1967)
Projetada pelos artistas pop Peter Blake e Jann Haworth, a consagrada capa deste disco fundamental dos Beatles, lançado pela Parlophone, é provavelmente a mais famosa já criada. Utiliza personagens da cultura pop norte americana, além de contrastar imagens coloridas com imagens em preto e branco.
Cream – Disraeli Gears (1967)
Ilustrações psicodélicas eram as preferidas para as capas de discos de bandas de rock. O design de Martin Sharp traz ícones surrealistas de alucinações induzidas por drogas em vermelho e amarelo lisérgicos. O LP foi lançado pela Polydor.
Essa capa é um exemplo clássico do efeito psicodélico causado pelo uso do LSD: Temos um grande número de imagens caleidoscópicas sobrepostas, causando uma sensação de alucinação visual, que é reforçada pelo uso de tons saturados, que ora se contrastam com tons mais luminosos.
The Jimi Hendrix Experience – Are You Experience (1967)
O designer Ed Thrasher trabalhou de uma maneira “mais simples” na capa desse disco. Ele utiliza um acorde dissonante, fazendo uma oposição tonal entre o amarelo luminoso e o magenta saturado. Apesar da tipografia psicodélica típica, conseguimos ler as palavras devido ao destaque que o amarelo proporciona ao magenta.
Dr. Timothy Leary PH.D. – L.S.D. (1966)
O mesmo princípio da capa de Jimi Hendrix vale para este modelo. Temos um contraste por oposição de tons complementares, embora a tipografia seja legível e de tom diferente. As letras verdes ganharam destaque do fundo, graças à presença de um terceiro tom, considerado neutro, o preto.
Bee Gees – Bee Gees’1st. (1967)
Designer: Klaus Voorman.
As características psicodélicas estão bem marcadas nesse álbum dos Bee Gees: Contrastes tonais, seja por complementaridade ou por diferenças de valores luminosos e de saturação; o uso de uma tipografia caleidoscópica, e a presença de elementos surrealistas.
The Velvet Underground – The Velvet Underground And Nico (1967)
Pintura “Banana”, de Andy Warhol.
Apesar de não possuir uma influência direta do psicodelismo, além dos tons contrastantes da figura, essa capa representa de maneira clara a influência da Pop Art durante a década de 60.
Cartazes
Os cartazes psicodélicos eram criados para uma platéia bem exclusiva, com letreiros praticamente ilegíveis, carregando a mensagem implícita: “Se você não consegue ler, não é para você.”
fonte: PUC-Rio / Departamento de Artes & Design
Análise Gráfica / 2006.2
Prof. Edna Lúcia Cunha Lima
Aluna: Clarissa Bottino
Objeto visual - Anos 60: Design e Psicodelismo
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